Jesus Cristo realmente existiu ou o cristianismo foi criado
em torno de uma lenda? Poucos estudiosos questionam a existência de Jesus, mas
alguns inimigos do cristianismo tentam provar o contrário.
Num processo contra o Vaticano, a Igreja foi acusada de
inventar a história da existência de Jesus. Apesar do caso ter sido retirado da
corte em fevereiro de 2006, o querelante, Luigi Cascioli, apelou, mas o caso
foi finalmente fechado. Os argumentos contra a existência de Jesus vieram a
público na rede CNN de TV quando Ellen Johnson, presidente dos American
Atheists, declarou:
“A realidade é que não existe nem uma vírgula de evidência
secular de que Jesus Cristo existiu. Jesus Cristo e o cristianismo se referem
uma religião moderna. E Jesus Cristo é uma compilação de outros deuses: Osíris,
Mitras, e outros tiveram as mesmas origens e a mesma morte como o mitológico
Jesus Cristo”. – Ellen Johnson, ateia
Johnson e um grupo especial de líderes religiosos discutiram
a questão, “O que acontece depois que morremos?” num programa Larry King Live
da CNN. O normalmente imperturbável King pausou e refletiu, respondendo depois:
“Então você não acredita que Jesus Cristo existiu?” Com um ar de confiança
Johnson respondeu: “Não, não existiu. Não é no que eu acredito, simplesmente
não existe evidência secular de que JC, Jesus Cristo, de fato tenha existido”.
King ficou sem resposta e foi para uma pausa para os comerciais. Ellen Johnson and Larry King, “What
Happens After We Die?” Larry King Live, CNN, April 14, 2005.
Cinquenta anos antes, Bertrand Russell chocou a sua geração
com o livro Porque não sou cristão em que pôs em causa a existência de Jesus.
Ele escreveu: “Historicamente é bastante duvidoso se Cristo existiu de fato, e
se Ele existiu não sabemos nada sobre Ele, tanto que não estou preocupado com a
questão histórica, que é por si uma questão bastante difícil”. Bertrand Russell, Why I Am Not a
Christian (New York: Simon & Schuster, 1957), 16.
É possível que o Jesus que muitos acreditam ser real nunca
tenha existido? Na História da Civilização, o historiador secular Will Durant
colocou a seguinte questão: “Terá Cristo realmente existido? Será que a
história do fundador do cristianismo é o produto da dor, imaginação e esperança
humanos - um mito comparável às lendas de Krishina, Osíris, Átis, Adónis,
Dionísio e Mitras?” Will
Durant, Caesar and Christ, vol. 3 of The Story of Civilization (New York: Simon
& Schuster, 1972), 553. Durant indicou como a história do
cristianismo possui “muitas semelhanças suspeitas com lendas dos deuses
pagãos”.[ Ibid., 557.] Mais tarde neste artigo veremos como este grande
historiador respondeu às suas próprias questões sobre a existência de Jesus.
Então, como podemos saber com certeza que este homem, que muitos idolatram e
outros amaldiçoam, foi de fato real? Será que Johnson está correta quando
afirma que Jesus Cristo é uma “compilação de outros deuses”? E Russell estará certo
quando diz que a existência de Jesus é “bastante duvidosa”?
Considerações sobre
Jesus Histórico.
Flávio Josefo é considerado como um dos maiores
historiadores judeus da sua época, e além de escrever sobre a História dos
Judeus e das suas guerras, também escreveu a sua autobiografia, na qual se
descreve como filho de Matias o sacerdote judaico, nascido em Jerusalém,
instruído pela torá e adepto do farisaísmo (JOSEFO, Flávio, História dos Judeus
– CPAD, 2000, pp.476-495). O seu testemunho é importante, pois é provavelmente
o único relato sobrevivente de uma testemunha ocular da destruição de
Jerusalém.
Josefo é considerado como um revolucionário judeu que se rendeu
à supremacia romana trocando o suicídio pela lealdade a Roma. Por sua
demonstração de lealdade, Vespasiano não apenas o recebeu como cidadão romano,
mas patrocinou-o como historiador.
No seu livro Antiguidade dos Judaicas, que é normalmente
datado na década de 90dC tem duas citações interessantes. A primeira faz clara
referência a Tiago “irmão de Jesus
chamado Cristo” (GEISLER, Norman, Não tenho fé suficiente para ser ateu –
Vida, 2006, pp.227), veja:
“Anano, um dos que nós falamos agora, era homem ousado e
empreender, da seita dos saduceus, que, como dissemos, são os mais severos de
todos os judeus e os mais rigorosos no julgamento. Ele aproveitou o tempo da
morte de Festo, e Albino ainda não havia chegado, para reunir um conselho
diante do qual fez comparecer Tiago, irmão de Jesus chamado Cristo, e alguns
outros; acusou-os de terem desobedecido às leis e os condenou ao apedrejamento.
Esse ato desagradou muito a todos os habitantes de Jerusalém, que eram piedosos
e tinham verdadeiro amor pela observância das nossas leis” – (JOSEFO, Flávio, História
Judaicas – CPAD, 2000, pp.465)
Dois fatos são interessantes nessa citação: (1) Confirma uma
clara declaração das escrituras: Jesus tinha um irmão chamado Tiago (Gl.1:19);
(2) Ele era reconhecido como Cristo, outra afirmação clara das escrituras
(Mt.16:16).
A segunda declaração de Josefo a respeito de Jesus é ainda
mais explícita e por isso, muito controversa. Pouco antes da declaração
supracitada, ele também afirma:
“Nesse mesmo tempo apareceu Jesus, que era um homem sábio,
se todavia devemos considera-lo simplesmente como um homem, tanto as suas obras
eram admiráveis. Ele ensinava os que tinham prazer em ser instruídos na verdade
e foi seguido não somente por muitos judeus, mas mesmo por muitos gentios. Ele
era o Cristo. Os mais ilustres da nossa nação acusaram-no perante Pilatos e ele
fê-lo crucificar. Os que o haviam amado durante a vida não o abandonaram depois
da morte. Ele lhes apareceu ressuscitado e vivo no terceiro dia, como os santos
profetas o tinham predito e que ele faria muitos outros milagres. É dele que os
cristãos, que vemos ainda hoje, tiraram seu nome” – (JOSEFO, Flávio, História
dos Judeus – CPAD, 2000, pp.418)
Esta citação tem sido criticada como sendo impossível de ter
sido proferida por um judeu-romano escrevendo sobre a história dos judeus.
Normalmente apela-se para o fato de que o texto acima é fruto de uma corrupção
cristã tardia, especialmente pelo fato de que Orígenes (185-253dC) atesta que
Josefo não aceitava a Messianidade de Jesus. Entretanto, essa declaração não é
inteiramente verdadeira, observe a declaração de Orígenes:
“Tamanha era a reputação de Tiago entre as pessoas
consideradas justas, que Flávio Josefo, que escreveu Antiguidade dos Judaicas
em vinte livros, quando ansiava por apresentar a causa pela qual o povo teria
sofrido grandes infortúnios que até mesmo o templo fora destruído, afirma que
essas coisas aconteceram com eles de acordo com a Ira de Deus em consequência
das coisas que eles se atreveram a fazer contra Tiago o irmão de Jesus que é
chamado Cristo. E o que é fantástico nisso é que, apesar de não aceitar Jesus
como Cristo, ele deu testemunho da justiça de Tiago” – (Orígenes, Origen’s
Commentarary on Matthew, IN: ROBERTS, Alexander, DONALDSON, James, Ante-Nicene
Fathers, VOL 9, pp.424)
Considerando o fato de que Orígenes atesta que Josefo o
chama de Cristo (como vimos que o faz quando fala sobre Tiago), embora não o
considerasse como tal, não é impossível que a citação seja de fato verdadeira.
Porém, devemos reconhecer que algumas das declarações desse texto atribuído a
Josefo parecem por demais cristãs para serem de um fariseu, e entendemos que
não é à toa que tenha sido considerada uma interpolação.
Edwin Yamauchi, professor emérito de história na
Universidade de Miami, comenta essa citação de Josefo e explica que é possível
perceber onde estão as interpolações, ou supostas alterações cristãs tardias.
Ele argumenta que era incomum para um cristão referir-se a Jesus Cristo apenas
como um homem sábio, o que sugere que o texto nesse caso é de Josefo. Por outro
lado, parece improvável que um judeu sugeriria que ele não era simplesmente um
homem. Nesse caso, Yamauchi atesta que esse é um possível caso de interpolação
cristã tardia. Sobre a expressão “Ele ensinava os que tinham prazer em ser
instruídos na verdade e foi seguido não somente por muitos judeus, mas mesmo
por muitos gentios”, Yamauchi defende que está em conformidade com o estilo e
vocabulário de Josefo, mas a conclusão “Ele era o Cristo” parece direta demais
para um judeu (STROBEL, Lee, Em defesa de Cristo, Vida, 1998, 104).
Contudo, ainda que tal citação de Josefo possa ser tomada
com algumas ressalvas, é importante lembrar que uma versão árabe do texto de
Josefo no mesmo trecho, que embora tenha as partes mais criticadas ausentes,
apresenta aspectos interessantes sobre Cristo, observe:
“Nessa época havia um homem sábio chamado Jesus. O seu
comportamento era bom, e sabe-se que era uma pessoa de virtudes. Muitos dentre
os judeus e de outras nações tornaram-se seus discípulos. Pilatos condenou-o à
cruficicação e à morte. E aqueles que haviam sido seus discípulos não deixaram
de o seguir. Eles relataram que ele lhes havia aparecido três dias depois da
crucificação e que ele estava vivo [...] talvez ele fosse o Messias, sobre o
qual os profetas relatavam maravilhas” – (GEISLER, Norman, Enciclopédia de
Apologética – Vida 2002, pp.449)
Após apresentar essa versão do texto de Josefo, num outro
livro Geisler explica a sua preferência por essa leitura:
“Existe uma versão dessa citação na qual Josefo afirma que
Jesus era o Messias, mas a maioria dos estudiosos acredita que os cristãos
mudaram a citação para que fosse lida dessa maneira. De acordo com Orígenes, um
dos pais da igreja nascido no século II, Josefo não era cristão. Desse modo, é
improvável que ele pudesse afirmar que Jesus era o Messias. A versão que
citamos aqui vem de um texto árabe que, acredita-se, não foi corrompido” –
(GEISLER, Norman, Não tenho fé suficiente para ser ateu – Vida, 2006, pp.227)
Diante dessas informações, devemos ainda lembrar que a
credibilidade de Josefo como historiador já foi colocada à prova diversas
vezes. Num livro de carácter provocador chamado Jesus e Javé, o judeu ateu
Harold Bloom logo de início apresenta a sua visão acerca de Cristo e Josefo:
“Não há fatos comprovados acerca de Jesus de Nazaré. Os
poucos fatos que constam na obra de Flávio Josefo, fonte da qual todos os
estudiosos dependem, são suspeitos, pois o historiador era José bem Matias, um
dos líderes da Rebelião Judaica, que salvou a própria pele por ter bajulado os
imperadores da Dinastia Flaviana: Vespasiano, Tito e Domício. Depois que um
indivíduo proclama Vespasiano como Messias, ninguém deve mais acreditar no que
tal pessoa escreve a respeito do seu povo. Josefo, mentiroso inveterado,
assistiu, tranquilamente à captura de Jerusalém, à destruição do Templo e à
matança dos habitantes” – (BLOOM, Harold, Jesus e Javé, os nomes divinos –
Objetiva, 2006, pp.31)
Nesse momento temos que fazer uma importante pergunta: “O
que ganharia esse judeu traidor nacional em mencionar a figura de Jesus?”.
Considerando o fato de que era financiado por Roma, era de se esperar que sua
visão pudesse ter sido comprada pelos romanos e sua história tenha cedido em
alguns lugares à tentação de ser conscientemente impreciso o que o levou a
ganhar a fama de mentiroso inveterado.
Contudo, aos olhos de Roma, essa nova “religião” tinha
claras tendências de ser facciosa ao Império em função do seu estranho conjunto
de doutrinas e sua objetiva recusa de adorar ou a César ou aos deuses romanos.
Com isso, era de se esperar que ele suprimisse qualquer evento, fato ou
personagem que pudesse o colocar em oposição com seus patrocinadores.
Portanto, é evidente que não haveria qualquer ganho para
Josefo em apresentar a pessoa de Jesus, e talvez, por essa mesma razão, é que
ele tenha escrito tão pouco a seu respeito. Mas, ainda assim, com o testemunho
de Josefo, nós podemos reconhecer algumas das características de Cristo e a sua
história, tal como contada pelos evangelistas:
(1) Jesus foi um homem considerado sábio;
(2) de bom comportamento e virtudes;
(3) tinha um irmão chamado Tiago
(4) teve muitos seguidores de diferentes nacionalidades;
(5) foi crucificado por Pilatos;
(6) por crucificação;
(7) nem por isso seus discípulos o abandonaram;
(8) eles relataram a ressureição de Cristo após três dias;
(9) além de uma possível relação com o Messias anunciado
pelas escrituras hebraicas.
José Carlos Costa,
pastor