24 de março de 2013

Foi Jesus Uma Pessoa Real?

Jesus Cristo realmente existiu ou o cristianismo foi criado em torno de uma lenda? Poucos estudiosos questionam a existência de Jesus, mas alguns inimigos do cristianismo tentam provar o contrário.

Desenho de Jesus encontrado nas
catacumbas em Roma.

Num processo contra o Vaticano, a Igreja foi acusada de inventar a história da existência de Jesus. Apesar do caso ter sido retirado da corte em fevereiro de 2006, o querelante, Luigi Cascioli, apelou, mas o caso foi finalmente fechado. Os argumentos contra a existência de Jesus vieram a público na rede CNN de TV quando Ellen Johnson, presidente dos American Atheists, declarou:
“A realidade é que não existe nem uma vírgula de evidência secular de que Jesus Cristo existiu. Jesus Cristo e o cristianismo se referem uma religião moderna. E Jesus Cristo é uma compilação de outros deuses: Osíris, Mitras, e outros tiveram as mesmas origens e a mesma morte como o mitológico Jesus Cristo”. – Ellen Johnson, ateia
Johnson e um grupo especial de líderes religiosos discutiram a questão, “O que acontece depois que morremos?” num programa Larry King Live da CNN. O normalmente imperturbável King pausou e refletiu, respondendo depois: “Então você não acredita que Jesus Cristo existiu?” Com um ar de confiança Johnson respondeu: “Não, não existiu. Não é no que eu acredito, simplesmente não existe evidência secular de que JC, Jesus Cristo, de fato tenha existido”. King ficou sem resposta e foi para uma pausa para os comerciais. Ellen Johnson and Larry King, “What Happens After We Die?” Larry King Live, CNN, April 14, 2005.
 
Cinquenta anos antes, Bertrand Russell chocou a sua geração com o livro Porque não sou cristão em que pôs em causa a existência de Jesus. Ele escreveu: “Historicamente é bastante duvidoso se Cristo existiu de fato, e se Ele existiu não sabemos nada sobre Ele, tanto que não estou preocupado com a questão histórica, que é por si uma questão bastante difícil”. Bertrand Russell, Why I Am Not a Christian (New York: Simon & Schuster, 1957), 16.
 
É possível que o Jesus que muitos acreditam ser real nunca tenha existido? Na História da Civilização, o historiador secular Will Durant colocou a seguinte questão: “Terá Cristo realmente existido? Será que a história do fundador do cristianismo é o produto da dor, imaginação e esperança humanos - um mito comparável às lendas de Krishina, Osíris, Átis, Adónis, Dionísio e Mitras?” Will Durant, Caesar and Christ, vol. 3 of The Story of Civilization (New York: Simon & Schuster, 1972), 553. Durant indicou como a história do cristianismo possui “muitas semelhanças suspeitas com lendas dos deuses pagãos”.[ Ibid., 557.] Mais tarde neste artigo veremos como este grande historiador respondeu às suas próprias questões sobre a existência de Jesus. Então, como podemos saber com certeza que este homem, que muitos idolatram e outros amaldiçoam, foi de fato real? Será que Johnson está correta quando afirma que Jesus Cristo é uma “compilação de outros deuses”? E Russell estará certo quando diz que a existência de Jesus é “bastante duvidosa”?
Considerações sobre Jesus Histórico.
Flávio Josefo é considerado como um dos maiores historiadores judeus da sua época, e além de escrever sobre a História dos Judeus e das suas guerras, também escreveu a sua autobiografia, na qual se descreve como filho de Matias o sacerdote judaico, nascido em Jerusalém, instruído pela torá e adepto do farisaísmo (JOSEFO, Flávio, História dos Judeus – CPAD, 2000, pp.476-495). O seu testemunho é importante, pois é provavelmente o único relato sobrevivente de uma testemunha ocular da destruição de Jerusalém.
 
Josefo é considerado como um revolucionário judeu que se rendeu à supremacia romana trocando o suicídio pela lealdade a Roma. Por sua demonstração de lealdade, Vespasiano não apenas o recebeu como cidadão romano, mas patrocinou-o como historiador.
No seu livro Antiguidade dos Judaicas, que é normalmente datado na década de 90dC tem duas citações interessantes. A primeira faz clara referência a Tiago “irmão de Jesus chamado Cristo” (GEISLER, Norman, Não tenho fé suficiente para ser ateu – Vida, 2006, pp.227), veja:
“Anano, um dos que nós falamos agora, era homem ousado e empreender, da seita dos saduceus, que, como dissemos, são os mais severos de todos os judeus e os mais rigorosos no julgamento. Ele aproveitou o tempo da morte de Festo, e Albino ainda não havia chegado, para reunir um conselho diante do qual fez comparecer Tiago, irmão de Jesus chamado Cristo, e alguns outros; acusou-os de terem desobedecido às leis e os condenou ao apedrejamento. Esse ato desagradou muito a todos os habitantes de Jerusalém, que eram piedosos e tinham verdadeiro amor pela observância das nossas leis” – (JOSEFO, Flávio, História Judaicas – CPAD, 2000, pp.465)
Dois fatos são interessantes nessa citação: (1) Confirma uma clara declaração das escrituras: Jesus tinha um irmão chamado Tiago (Gl.1:19); (2) Ele era reconhecido como Cristo, outra afirmação clara das escrituras (Mt.16:16).
A segunda declaração de Josefo a respeito de Jesus é ainda mais explícita e por isso, muito controversa. Pouco antes da declaração supracitada, ele também afirma:
“Nesse mesmo tempo apareceu Jesus, que era um homem sábio, se todavia devemos considera-lo simplesmente como um homem, tanto as suas obras eram admiráveis. Ele ensinava os que tinham prazer em ser instruídos na verdade e foi seguido não somente por muitos judeus, mas mesmo por muitos gentios. Ele era o Cristo. Os mais ilustres da nossa nação acusaram-no perante Pilatos e ele fê-lo crucificar. Os que o haviam amado durante a vida não o abandonaram depois da morte. Ele lhes apareceu ressuscitado e vivo no terceiro dia, como os santos profetas o tinham predito e que ele faria muitos outros milagres. É dele que os cristãos, que vemos ainda hoje, tiraram seu nome” – (JOSEFO, Flávio, História dos Judeus – CPAD, 2000, pp.418)
Esta citação tem sido criticada como sendo impossível de ter sido proferida por um judeu-romano escrevendo sobre a história dos judeus. Normalmente apela-se para o fato de que o texto acima é fruto de uma corrupção cristã tardia, especialmente pelo fato de que Orígenes (185-253dC) atesta que Josefo não aceitava a Messianidade de Jesus. Entretanto, essa declaração não é inteiramente verdadeira, observe a declaração de Orígenes:
“Tamanha era a reputação de Tiago entre as pessoas consideradas justas, que Flávio Josefo, que escreveu Antiguidade dos Judaicas em vinte livros, quando ansiava por apresentar a causa pela qual o povo teria sofrido grandes infortúnios que até mesmo o templo fora destruído, afirma que essas coisas aconteceram com eles de acordo com a Ira de Deus em consequência das coisas que eles se atreveram a fazer contra Tiago o irmão de Jesus que é chamado Cristo. E o que é fantástico nisso é que, apesar de não aceitar Jesus como Cristo, ele deu testemunho da justiça de Tiago” – (Orígenes, Origen’s Commentarary on Matthew, IN: ROBERTS, Alexander, DONALDSON, James, Ante-Nicene Fathers, VOL 9, pp.424)
Considerando o fato de que Orígenes atesta que Josefo o chama de Cristo (como vimos que o faz quando fala sobre Tiago), embora não o considerasse como tal, não é impossível que a citação seja de fato verdadeira. Porém, devemos reconhecer que algumas das declarações desse texto atribuído a Josefo parecem por demais cristãs para serem de um fariseu, e entendemos que não é à toa que tenha sido considerada uma interpolação.
Edwin Yamauchi, professor emérito de história na Universidade de Miami, comenta essa citação de Josefo e explica que é possível perceber onde estão as interpolações, ou supostas alterações cristãs tardias. Ele argumenta que era incomum para um cristão referir-se a Jesus Cristo apenas como um homem sábio, o que sugere que o texto nesse caso é de Josefo. Por outro lado, parece improvável que um judeu sugeriria que ele não era simplesmente um homem. Nesse caso, Yamauchi atesta que esse é um possível caso de interpolação cristã tardia. Sobre a expressão “Ele ensinava os que tinham prazer em ser instruídos na verdade e foi seguido não somente por muitos judeus, mas mesmo por muitos gentios”, Yamauchi defende que está em conformidade com o estilo e vocabulário de Josefo, mas a conclusão “Ele era o Cristo” parece direta demais para um judeu (STROBEL, Lee, Em defesa de Cristo, Vida, 1998, 104).
Contudo, ainda que tal citação de Josefo possa ser tomada com algumas ressalvas, é importante lembrar que uma versão árabe do texto de Josefo no mesmo trecho, que embora tenha as partes mais criticadas ausentes, apresenta aspectos interessantes sobre Cristo, observe:
“Nessa época havia um homem sábio chamado Jesus. O seu comportamento era bom, e sabe-se que era uma pessoa de virtudes. Muitos dentre os judeus e de outras nações tornaram-se seus discípulos. Pilatos condenou-o à cruficicação e à morte. E aqueles que haviam sido seus discípulos não deixaram de o seguir. Eles relataram que ele lhes havia aparecido três dias depois da crucificação e que ele estava vivo [...] talvez ele fosse o Messias, sobre o qual os profetas relatavam maravilhas” – (GEISLER, Norman, Enciclopédia de Apologética – Vida 2002, pp.449)
Após apresentar essa versão do texto de Josefo, num outro livro Geisler explica a sua preferência por essa leitura:
“Existe uma versão dessa citação na qual Josefo afirma que Jesus era o Messias, mas a maioria dos estudiosos acredita que os cristãos mudaram a citação para que fosse lida dessa maneira. De acordo com Orígenes, um dos pais da igreja nascido no século II, Josefo não era cristão. Desse modo, é improvável que ele pudesse afirmar que Jesus era o Messias. A versão que citamos aqui vem de um texto árabe que, acredita-se, não foi corrompido” – (GEISLER, Norman, Não tenho fé suficiente para ser ateu – Vida, 2006, pp.227)
Diante dessas informações, devemos ainda lembrar que a credibilidade de Josefo como historiador já foi colocada à prova diversas vezes. Num livro de carácter provocador chamado Jesus e Javé, o judeu ateu Harold Bloom logo de início apresenta a sua visão acerca de Cristo e Josefo:
“Não há fatos comprovados acerca de Jesus de Nazaré. Os poucos fatos que constam na obra de Flávio Josefo, fonte da qual todos os estudiosos dependem, são suspeitos, pois o historiador era José bem Matias, um dos líderes da Rebelião Judaica, que salvou a própria pele por ter bajulado os imperadores da Dinastia Flaviana: Vespasiano, Tito e Domício. Depois que um indivíduo proclama Vespasiano como Messias, ninguém deve mais acreditar no que tal pessoa escreve a respeito do seu povo. Josefo, mentiroso inveterado, assistiu, tranquilamente à captura de Jerusalém, à destruição do Templo e à matança dos habitantes” – (BLOOM, Harold, Jesus e Javé, os nomes divinos – Objetiva, 2006, pp.31)
Nesse momento temos que fazer uma importante pergunta: “O que ganharia esse judeu traidor nacional em mencionar a figura de Jesus?”. Considerando o fato de que era financiado por Roma, era de se esperar que sua visão pudesse ter sido comprada pelos romanos e sua história tenha cedido em alguns lugares à tentação de ser conscientemente impreciso o que o levou a ganhar a fama de mentiroso inveterado.
Contudo, aos olhos de Roma, essa nova “religião” tinha claras tendências de ser facciosa ao Império em função do seu estranho conjunto de doutrinas e sua objetiva recusa de adorar ou a César ou aos deuses romanos. Com isso, era de se esperar que ele suprimisse qualquer evento, fato ou personagem que pudesse o colocar em oposição com seus patrocinadores.
 
Portanto, é evidente que não haveria qualquer ganho para Josefo em apresentar a pessoa de Jesus, e talvez, por essa mesma razão, é que ele tenha escrito tão pouco a seu respeito. Mas, ainda assim, com o testemunho de Josefo, nós podemos reconhecer algumas das características de Cristo e a sua história, tal como contada pelos evangelistas:
 
(1) Jesus foi um homem considerado sábio;
(2) de bom comportamento e virtudes;
(3) tinha um irmão chamado Tiago
(4) teve muitos seguidores de diferentes nacionalidades;
(5) foi crucificado por Pilatos;
(6) por crucificação;
(7) nem por isso seus discípulos o abandonaram;
(8) eles relataram a ressureição de Cristo após três dias;
(9) além de uma possível relação com o Messias anunciado pelas escrituras hebraicas.
 
José Carlos Costa, pastor