Milhões de pessoas, em todo o mundo, gostariam de ver de perto a maior relíquia do romanismo: um pedaço de pano chamado de Santo Sudário. Entre manchas envelhecidas de sangue, de água e de tecido queimado, percebe-se com algum esforço a imagem de um homem barbudo e despido. Para muitos fiéis católicos, não há dúvida: é a imagem do corpo de Jesus, que, segundo a Bíblia, foi envolto em lençóis (Jo 20.1-7).
Há quase vinte anos, exames atestaram que o lençol era uma fraude. Para muitos cientistas, o pano não tem a mais remota chance de ser da época de Cristo. Ou alguém o produziu querendo fazer crer que era o sudário verdadeiro, ou ele foi usado num funeral da Idade Média, e tudo não passa de uma grande coincidência. Constatou-se, finalmente, que a imagem fora criada na Idade Média a partir de pinturas bem trabalhadas.
Entretanto, estudiosos de diversas áreas têm reaberto a polémica em torno da autenticidade do sudário. Por um lado, na Idade Média, as crucificações já eram coisa do passado; por outro, seria praticamente
impossível que um pintor produzisse uma imagem tão clara de um homem crucificado. O tecido possui várias camadas de fibras e apenas a mais superficial delas apresenta outra tonalidade, criando o desenho. Como conseguiria tal proeza um pintor?
impossível que um pintor produzisse uma imagem tão clara de um homem crucificado. O tecido possui várias camadas de fibras e apenas a mais superficial delas apresenta outra tonalidade, criando o desenho. Como conseguiria tal proeza um pintor?
Em 1898, o fotógrafo profissional italiano Secondo Pia, ao retratar a relíquia, levou um susto: no negativo, surgia a imagem nítida do corpo que, no pano, aparece embaçado. Foi esse efeito do negativo que fascinou tanto os estudiosos céticos como os crédulos. Todos, admirados, passaram a admitir que, se o pano for uma fraude, trata-se da mais enigmática e mais bem elaborada da História.
Diversos tipos de análise foram favoráveis à autenticidade da mortalha. Mas o teste do carbono 14 confirmou que o tecido data de um período compreendido entre 1290 e 1390, não podendo ser de Cristo. Esse teste — realizado com base na quantidade de átomos radioativos de carbono impregnada num objeto de origem orgânica — é conclusivo. Ou melhor, quase conclusivo, pois alguns detalhes precisam ser considerados.
Em 1503, o sudário foi fervido em óleo. O objetivo era provar a sua autenticidade: se a imagem não desaparecesse, ela seria “santa”. E ela não desapareceu. Em 1532, num incêndio, o pano foi atingido por labaredas que lhe deixaram marcas. Para físicos da Universidade de Harvard (EUA), o calor teria afetado a precisão do teste do carbono 14. Eles usaram a técnica em panos antigos, antes e depois de chamuscar os resultados, percebendo diferenças de até 600 anos nos resultados.
Se o sudário for uma fraude, é uma fraude genial, minuciosamente calculada. As chagas das mãos estão na altura dos pulsos, entre oito ossos em que estaria o ponto capaz de, trespassado por um cravo, sustentar o peso do corpo pendurado na cruz. Esse detalhe anatómico, segundo os entendidos, não era conhecido no século XIII.
O químico norte-americano Alan Adler conseguiu provar que o tecido contém moléculas que o organismo despeja quando passa várias horas em estresse extremo. Há também substâncias secretadas nos coágulos das feridas que são invisíveis, as quais só foram descobertas no século passado. Como alguém, sem saber da sua existência, poderia colocá-las no pano?
Na verdade, não se pode afirmar que a mortalha envolveu o corpo de Jesus. Mas há muitos fatores que favorecem tal pensamento. Estudos demonstraram, ainda, que a pessoa envolvida pelo pano tinha 1,83 metro de altura e 81 quilos. A coroa de espinhos era na forma de capacete. Nas costas, há marcas dos 39 golpes de chicote que os soldados tinham de aplicar, conforme a lei romana. Só um gênio conseguiria forjar tudo isso no período medieval.
A riqueza de detalhes do sudário fica mais desnorteante quando se vê a reconsti-tuição da imagem em forma tridimensional, feita por computador. A impressão que se tem é que ela foi produzida por meio de uma forte radiação emanada do corpo. Assim, tudo leva a crer que o tecido teria envolvido o corpo de uma pessoa morta em decorrência de uma crucificação.
Se o lençol for verdareiramente o que envolvera a Jesus, constitui-se na mais im-portante prova da veracidade da narrativa bíblica de João 19.40: “Tomaram pois o corpo de Jesus e o envolveram em lençóis com as especiarias, como os judeus costumam fazer, na preparação para o sepulcro”. Ao mesmo tempo, porém, pode levar pessoas a idolatrar o pedaço de pano.
Os factos apresentados demonstram que há razões fortes para crer na autenticidade do Santo Sudário. A questão do pano ser real, contudo, não determina que ele seja, necessariamente, de Cristo. As crucificações na época em que Jesus andou na terra eram comuns. Isso significa que o manto poderia ter envolvido outro corpo. Bem, nesse caso, a melhor atitude para o cristão é ficar com um conhecido texto do Antigo Testamento: “As coisas encobertas são para o Senhor nosso Deus, porém as reveladas para nós...”, Dt 29.29.