Sábado é um dos temas mais relevantes e significativos das Escrituras. Como “um santuário no tempo”, ele lembre e enaltece a acção criadora e redentora de Deus. mas, lamentavelmente, a observância desta instituição foi sendo ofuscada pela aceitação de ensinos não bíblicos. No período intertestamentário, os mestres do judaísmo revestiram o Sábado de uma forte ênfase legalística. Por sua vez, o cristianismo pós apostólico não mediu esforços para se distanciar desta instituição divina, buscando, por todos os meios possíveis, transferir a santidade do Sábado para o Domingo (cf. Dan. 7:25). Um golpe ainda mais profundo foi dado pelo evolucionismo moderno, propondo que tanto o Sábado como o próprio Criador do Sábado não passam de entidades mitológicas.
Significativos esforços vêm sendo feitos para revitalizar a observância do Domingo no mundo contemporâneo. Por exemplo, o Papa João Paulo II publicou, em 1998, a sua Carta Apostólica “Dies Domini”, apelando ao clero e aos fiéis da Igreja Católica para enaltecerem mais intencionalmente a santificação do Domingo. Em 2005, foi estabelecida nos Estados Unidos a “Comissão dos Dez Mandamentos”, formada por influentes líderes religiosos judaicos e cristãos. Desde o dia 7 de Maio de 2006, o primeiro “Domingo” de Maio de cada ano tem sido comemorado naquele país como o Dia dos Dez Mandamentos. Em ambos os casos, o Domingo é visto como substituo do Sábado.
Sem dúvida, o tempo é mais do que oportuno para uma compreensão mais acurada da natureza e do significado do Sábado bíblico. Daí a pertinência deste artigo que considera o Sábado na Criação, na Redenção e no tempo do fim.
1. Na Criação.
A origem do Sábado está directamente relacionada com a obra de Deus como Criador de todas as coisas. A semana da Criação atingiu o seu clímax quando Deus descansou no sétimo dia, além de o abençoar, e santificar (Gén. 2:2,3).
Este triplo acto divino representou a instituição do Sábado para os seres humanos (Mar. 2:27). Karl Barth sugere que “a clara inferência é que a Criação, e supremamente o homem, descansou com Deus no sétimo dia e participou da Sua liberdade, descanso e alegria, mesmo não tendo ainda realizado nenhum trabalho que tivesse de cessar. E a sua liberdade, descanso e alegria no Sábado podiam apenas observar a obra de Deus e não a sua própria”.
De acordo com o quarto mandamento do Decálogo, o Sábado deve ser observado “porque, em seis dias, fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia, descansou; por isso, o Senhor abençoou o dia de Sábado e o santificou” (Êx. 20:11). Na epístola aos Hebreus, o descanso divino “no sétimo dia” da semana da Criação é mantido como modelo para os cristãos (ver Heb. 4:4-11). Portanto, a alegação papal de que “o preceito do Sábado…na primeira Aliança” é simplesmente insustentável. O próprio mandamento divino define que “o sétimo dia é o Sábado do Senhor, teu Deus” (Êx. 20:10).
Embora os mestres do judaísmo revestissem o Sábado de um formalismo legatístico antibíblico, a verdadeira observância do Sábado é o Maio antídoto contra o legalismo.
Comentando o primeiro Sábado na existência de Adão e Eva, Sakae Kubo menciona que “eles descansaram, não por causa de algo que tinham feito, mas porque Deus tinha finalizado a Sua obra. Não podiam aprestar qualquer coisa que eles tivessem feito. Tudo o que podiam fazer era ver o que Deus tinha feito por eles. Consequentemente, eles aproximaram-se do Sábado de mãos vazias de qualquer mérito humano”.
Observando o Sábado, somos levados a reconhecer Deus como o nosso Criador, a nós mesmos como as Suas criaturas; e a deixar de lado os nosos “próprios interesses” (Isa. 58:13) para confiar nas obras de Deus. Ellen White declara: “Se o Sábado tivesse sido guardado universalmente, os pensamentos e afectos dos homens teriam sido dirigidos ao Criador como objecto de reverência e culto, e nunca terá havido um idólatra, um ateu, ou um infiel. A guarda do Sábado é um sinal de lealdade para com o verdadeiro Deus, `Aquele que fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas´”.
2. Na Redenção.
A entrada do pecado no mundo gerou uma realidade antagónica aos ideais divinos. Deus, porém, estabeleceu um plano destinado a reverter essa realidade. O Sábado, que já era um símbolo da Sua obra criadora Deus, tornou-se também um símbolo da Sua obra redentora. Este significado adicional do Sábado é evidente em pelo menos três importantes momentos da história da salvação. O primeiro deles foi a dádiva do maná durante seis dias da semana e o milagre da sua preservação durante o Sábado (Êx. 16:22-24). Nesse incidente, o alimento era provido e preservado pela actuação divina, sem méritos humanos.
Outro importante momento foi a própria enunciação da Lei no Sinai (ver Êxodo 19 e 20), que ocorreu num “contexto de graça”, precedido pela eleição de Israel (Deut. 6:6-8). Libertação da escravidão egípcia. Em Êxodo 20, o Decálogo é introduzido pela declaração da graça salvadora de Deus. “Eu sou o Senhor, teu Deus, que te tirei da terra do Egipto, da casa da servidão” (v.2). Em Deuteronómio 5, a mesma graça salvadora é incorporada ao próprio mandamento do Sábado: “porque te lembrarás que foste servo na terra do Egipto e que o Senhor, teu Deus, te tirou dali com mão poderosa e braço estendido; pelo que o Senhor, teu Deus, te ordenou que guardasses o dia de Sábado” (v. 15).
Qualquer tentativa de inserir o Decálogo e o Sábado numa moldura legalista é desonesta para com o texto bíblico. Gerhard von Rad esclarece que “é impossível, pois, considerar os mandamentos do Deuteronómio como uma “lei”, no sentido teológico, que leve Israel a merecer a salvação pela observação global das exigências divinas. Os mandamentos do Deuteronómio são antes uma grande explicação do mandamento do amor por Javé e de apego exclusivo a Ele (Deut. 6:4). Esse amor é a resposta de Israel ao amor divino que lhe foi testemunhado”.
O terceiro importante momento que associa o Sábado com a obra de redenção é o supremo evento da paixão de Cristo. Durante o Seu ministério terrestre, Jesus não apenas frequentava a sinagoga no Sábado (Luc. 4:16), mas também procurava restaurar a verdadeira observância do Sábado como expressão da graça redentora de Deus, afirmando ser”lícito, nos sábados, fazer o bem” (Mat. 12:12). Esse processo atingiu o seu clímax quando Ele descansou na sepultura no fim da semana da paixão. Assim como no princípio Ele tinha repousado “no Sábado após a Sua obra de criação”, Ele descansou outra vez no Sábado “da obra de redenção”. Seguindo o Seu exemplo, também os discípulos, “no Sábado, descansaram, segundo o mandamento” (Luc. 23:56).
Um dos argumentos mais usados para justificar a observância do Domingo é que a ressurreição de Cristo no “primeiro dia da semana” (Mat. 28:1; Mar. 16:1,2; Luc. 24:1; João 20:1) transformou esse dia num substituto do Sábado bíblico do sétimo dia. Mas a observância do Domingo não possui nenhuma base bíblica, e desrespeita a obra criadora e redentora de Deus, da qual apenas o Sábado é um símbolo.
A alegação de que a Bíblia favorece o princípio da observância de um dia em sete, independente de qual seja esse dia, está baseada numa releitura equivocada das Escrituras. Como já mencionado, o mandamento do Sábado estabelece especificamente que “o sétimo dia é o Sábado do Senhor, teu Deus” (Êx. 20:10). Portanto, o conflito ente o Sábado e o Domingo é, em última instância, uma disputa entre a autoridade de Deus e as pretensões humanas.
3. No tempo do fim.
O livro do profeta Daniel descreve um poder apóstata que desrespeitaria a autoridade do Altíssimo, deitando “por terra a verdade” e cuidando “em mudar os tempos e a lei” (Dan. 7:25; 8:12). Cristo referiu-Se à actuação desse poder como ainda futura, nos Seus dias (Mat. 24:15). Em contraste, Daniel 8:13,14 declara que, no fim das 2300 tardes e manhãs, surgiria um movimento de restauração da verdade. Nesse processo, seria de fundamental importância a proclamação da primeira mensagem angélica de Apocalipse 14: “Vi outro anjo voando pelo meio do céu, tendo um evangelho eterno para pregar aos que se assentam sobre a terra, e a cada nação, e tribo, e língua, e povo, dizendo, em grande voz: Temei a Deus e dai-Lhe glória, pois é chegada a hora do Seu juízo; e adorai Aquele que fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas” (vs. 6,7).
O conteúdo desta mensagem angélica enaltece Deus como Criador (Aquele que fez”) e Redentor (“evangelho eterno”). A expressão “fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas” (Apoc. 14:7) é extraída do quarto mandamento do Decálogo, onde é dito que “fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo o que neles há” (Êx. 20:11; cf. Sal. 146:6).
De acordo com com Jon Paulien, a “atenção ao mandamento do Sábado é, portanto, a resposta que Deus busca dos Seus fiéis seguidores”. O povo remanescente de Deus é descrito na terceira mensagem angélica como aqueles que “guardam os mandamentos de Deus e a fé em Jesus” (Apoc. 14:12).
Identificando “os mandamentos de Deus” com o Decálogo (Êx. 20:3-17), Simon J. Kistemarker afirma que “a Lei de Deus perdura ao longo das eras; não necessita de ser emendada; é relevante para todas as culturas; e jamais será repudiada”. Evidentemente, a restauração da verdade no tempo do fim envolve também a restauração do quarto mandamento, que ordena a observância do “Sábado do Senhor, teu Deus” (Êx. 20:10). À semelhança do antigo Israel, o povo de Deus ainda hoje necessita de ser “reparador de brechas e restaurador de veredas” com respeito à observância do Sábado (Isa. 58:12-14).
Em Hebreus 4:4-11, o descanso de Deus no sétimo dia da Criação (Gén. 2:2,3; cf. Êx. 20:8-11) é mantido como modelo para os cristãos. Um estudo detido desse “repouso” (grego sabbatismós), no qual o “povo de Deus” deve entrar (v.9), revela ser o descanso da justificação pela fé, do qual o Sábado é um sinal. E o apelo de Hebreus 4:11 é: “Esforcemo-nos, pois, por entrar naquele descanso, a fim de que ninguém caia, seguindo o mesmo exemplo de desobediência.”
Conclusão – O Sábado é uma instituição divina estabelecida para os seres humanos no fim da semana da Criação. Transportando os séculos, ele chega até nós como um santuário no tempo, revelando e mostrando Deus como nosso Criador e Redentor. A despeito de todas as tentativas de revesti-lo com uma roupagem legalística, o Sábado bíblico enfatiza sempre as graciosas obras de Deus, e nãos os méritos humanos. Observando-o em conformidade com os mandamentos divinos, reconhecemos que os caminhos de Deus, embora nem sempre sejam os mais fáceis, são sempre melhores do que os nossos próprios caminhos. Sem dúvida, “o Sábado é um elo de ouro que liga Deus ao Seu povo”.
Deus espera que, nestes últimos dias da história humana, cada Adventista do Sétimo Dia não apenas creia no Sábado bíblico e o observe, mas também o proclame ao maior número possível de pessoas. Em Isaías 58:13 e 14, a promessa divina a todos os observadores do Sábado é: “Se desviares o pé de profanar o Sábado e de cuidar dos teus próprios interesses no Meu santo dia; se chamares ao Sábado deleitoso e santo dia do Senhor, digno de honra, e o honrares não seguindo os teus caminhos, não pretendendo fazer a tua própria vontade, nem falando palavras vãs, então, te deleitarás no Senhor. Eu te farei cavalgar sobre os altos da terra e te sustentarei com a herança de Jacob, teu pai, porque a boca do Senhor o disse.”
Dr. Alberto R. Timm