5 de maio de 2013

João 1.1: Interpretação Bíblica – Quem a Influencia?

O que levou o escritor a traduzir João 1:1 em apoio da doutrina da Trindade? Foram as ‘escrituras que o informaram’ para fazer assim? Isso é impossível, porque a doutrina da Trindade não é encontrada em parte alguma da Bíblia. Observe o que The New Encyclopædia Britannica diz sobre isso: “Nem a palavra Trindade, nem a doutrina explícita constam no Novo Testamento.” Ademais, o professor E. Washburn Hopkins, da Universidade de Yale, disse: “Jesus e Paulo aparentemente desconheciam a doutrina da trindade; . . . nada dizem a seu respeito.” Assim, o que podemos concluir a respeito dos que apoiam a interpretação trinitária de João 1:1 ou de qualquer outro versículo da Bíblia? De acordo com o próprio critério do Sr. Lingard, “não são as Escrituras que os informam, mas são eles que acrescentam suas próprias ideias à linguagem das Escrituras” - Sentinela, 1 de Agosto de 1999, pp.10
No artigo chamado Interpretação da Bíblia, quem a influência, os autores da revista A Sentinela apresentaram um caso interessante em que um católico chamado John Lingard afirma: “Homens de todas as crenças encontram a confirmação das suas próprias opiniões nos escritos sagrados, pois, de fato, não são as Escrituras que os informam, mas são eles que acrescentam as suas próprias ideias à linguagem das Escrituras”. Segundo tais autores, essa afirmação foi feita em defesa da tradução que Lingard fez de João1:1 que os autores da Sentinela chamam de tradução trinitária.
Neste momento devemos colocar uma pergunta importante: Esse texto de João 1.1 defende a doutrina da Trindade? Certamente não. Note que em João 1:1, mesmo nas versões mais trinitárias, não encontramos nenhuma referência ao Espírito Santo. Portanto, não podemos assumir que a Trindade seja referida em João 1:1. Nesse sentido, a Sentinela está correta.
Porém, devemos colocar outra pergunta importante: Sobre quem fala esse texto? A resposta correta seria: Sobre Deus, o Pai, e o Filho de Deus, Jesus Cristo e a relação que mantém desde o princípio. Observe o que o texto diz: “No princípio era a Palavra, e a Palavra estava com o Deus, e a Palavra era [um] deus“. Algumas partes desse texto são extremamente claras e não tem qualquer problema de tradução, e para identificá-las usamos aqui o termo sublinhado.
Busque nas diferentes versões que você encontrar, e você poderá perceber que de modo diferente, todas as traduções irão dizer que no princípio a Palavra era. Nenhuma tradução diz que a Palavra veio a existir no princípio. Também temos por certo que o termo princípio, não se refere ao princípio de Deus, o Pai, pois ele não tem princípio. Ou seja, esse princípio deve ser o princípio da Criação. Mas, o que significa dizer que a Palavra era na Criação? O verbo no passado aqui parece sugerir que a Palavra já existia antes do princípio da Criação.
Isso é interessante, pois sabemos pelo Evangelho de João que Jesus existe desde antes da Criação. Em João 8.58 o vemos dizer: “Jesus disse-lhes: “Digo-vos em toda a verdade: Antes de Abraão vir à existência, eu tenho sido“. Ele também disse em João 17.24: “Pai, quanto ao que me tens dado, quero que, onde eu estiver, eles também estejam comigo, a fim de que observem a minha glória que me tens dado, porque me amaste antes da fundação do mundo“. Em outras palavras, Jesus está dizendo que antes da Criação iniciar, Jesus já tinha um relacionamento de amor estabelecido com Jeová. Portanto, devemos admitir que Jesus não faz parte das coisas criadas, pois existe antes da Criação em um relacionamento de amor com Deus. Aliás, em João 1:1 lemos que no princípio a Palavra estava com Deus. Ou seja, Jesus e Jeová já conviviam juntos antes mesmo do princípio da Criação. É por isso que ele é chamado Criador de todas as coisas: “Todas as coisas vieram à existência por intermédio dele, e à parte dele nem mesmo uma só coisa veio à existência. O que veio à existência” (João1:3).
Portanto, devemos admitir que pelo testemunho de João, Jesus não é, nem pode ser uma criatura pois já existia antes de tudo vir à existência. Ele também não pode ser o Jeová Deus com quem estava, afinal de contas, desde antes da fundação do mundo eles já conviviam num relacionamento de intimidade. Esses dois conceitos estão claramente demonstrados no próprio verso, e deles o próprio Jesus dá testemunho no mesmo evangelho.
Em primeiro lugar, devemos lembrar do que aprendemos com esse texto até aqui: (1) Jesus não pode ser uma criatura, pois existe antes da criação iniciar e (2) e já estava em um relacionamento de
intimidade com Jeová Deus antes de tudo iniciar, e por isso não pode ser o Deus com quem estava. Portanto, se Jesus é [um] deus, devemos admitir que ele é [um] deus diferente de Jeová Deus.
Em segundo lugar, devemos lembrar que Jesus mesmo ensina que não existe outro Deus verdadeiro: “Isto significa vida eterna, que absorvam conhecimento de ti, o único Deus verdadeiro, e daquele que enviaste, Jesus Cristo“. Se Jeová Deus é o único Deus verdadeiro, a Palavra seria um deus falso. Mas, sabemos que isso não é verdade. Então, o que o texto nos quer ensinar?
Observe que a interpretação do texto é fundamental para compreendermos o seu sentido verdadeiro, e não aquele que queremos colocar no texto. Contudo, já percebemos que colocar o artigo indefinido aqui em João 1:1 causaria sérios problemas com as próprias palavras de Jesus. Outro detalhe que deve ser lembrado é que o termo usado por João aqui (gr. theós), não é usado em nenhum lugar no NT para descrever uma pessoa poderosa. Das 1317 vezes que esse termo é usado no Novo Testamento, nenhuma vez o termo tem esse sentido. O sentido normal e absolutamente majoritário do termo no NT é uma referência a Deus. No evangelho de João, das 69 vezes que João usa o termo, apenas duas vezes o termo não é usado em referência a Deus (João 10.35, 36), mas nas duas vezes ele usa o termo no plural. Em três outras ocasiões, o termo é usado em referência a Jesus Cristo (1:1; 1:18; 20:28), sendo que as duas primeiras vêm sem artigo, mas a última vem com artigo numa frase dita a Jesus Cristo, e ele não se importou em ser chamado “o Deus“.
Ou seja, João, que parece ser um autor inteligente e sabe escolher as palavras que usa, sem contar que foi direcionado por Deus para escrever um escrito inspirado, está a dizer que Jesus é Deus, e não um Deus como a Tradução do Novo Mundo sugere. E se Jesus diz que é anterior à Criação, que é Criador de todas as coisas, que é um com Deus Pai faria todo sentido que Ele fosse chamado Deus. Mais interessante ainda é que o modo como João escreve essa frase tem duas peculiaridades que precisam ser lembradas:
 1. João não usou artigo quando escreveu o termo Deus: Alguns dizem que por não ter artigo, o termo Deus aqui deveria carregar um artigo indefinido. Mas, será que ousaríamos fazer o mesmo com as outras ocasiões no mesmo capítulo do Evangelho de João? Ele usou o mesmo termo 12 vezes no mesmo capítulo e 6 vezes o fez sem artigo (v. 1, 6, 12, 13, 18×2). Nessas seis ocorrências, temos a certeza que 3x o termo é usado em referência a Deus (v. 6, 13 e 18). Seria justo colocar um artigo indefinido em todas essas ocasiões? Claro que não, pois os textos deixam claro que João fala do Deus Pai. Mas, o que o texto de João 1:1 fala sobre a Palavra?
 2. João usou uma ordem interessante para o verso: A ordem das palavras desse verso é interessante, pois quando o autor coloca o predicado do sujeito sem artigo antes do verbo de ligação, o sentido dessa frase é normalmente qualitativo, como João o faz em pelo menos 44x no mesmo evangelho (1.12; 14; 2.9; 3.4, 6 x2, 29; 4.19; 6.33 x2, 70; 8.31, 33, 34, 37, 39, 44 x2, 48; 9.8, 17, 24, 25, 27, 28, 10.1, 2, 8, 13, 33, 34, 36; 11.51; 12.6, 29, 26, 50; 13.35; 15.14; 18.25, 35 x2, 37 x2). Com esse sentido, o texto estaria a dizer que Jesus tem a mesma essência de Deus, mas não sendo o próprio Deus com quem Ele estava. Por outras palavras, João está a ensinar-nos que a Palavra não é a mesma pessoa que Jeová Deus, mas que é tão Deus quanto Ele é.
Considerando o contexto de João 1:1, a sua gramática e a opinião do próprio evangelista em outros lugares fica evidente que João 1:1 atesta a divindade de Jesus: Ele não é a mesma pessoa que Jeová Deus, mas é tão Deus quanto Ele. Mas, isso não é uma das características da doutrina da Trindade? Certamente que sim. Então esse texto prova a Trindade? Claro que não. Esse texto prova um dos pontos da Doutrina da Trindade, que Jesus e Jeová não são a mesma pessoa, mas a mesma essência. Isso explica por que a publicação citada no início desse post ataca tão ferozmente a ideia de que esse texto possa falar sobre a Trindade.
Contudo, note a sagacidade desses autores: Eles pressupõem que tal tradução foi feita para defender a doutrina da Trindade, e conduzem os seus leitores a pensarem o mesmo. Entretanto, esse texto não defende a doutrina da Trindade, até por que nada fala sobre o Espírito Santo. Esse pressuposto inserido na conversa conduz seus leitores a pensarem que seria um absurdo defender a doutrina da Trindade nesse texto.
E como quem tira diante dos olhos dos seus leitores o texto que Lingard traduziu, os autores conduzem seus leitores a Enciclopédia Britânica que supostamente afirma que nem a palavra Trindade nem seu conceito são encontrados no NT e que o professor Washburn afirma que Paulo e Jesus não a conheciam e nada falaram sobre ela. Em nenhum momento a Sentinela apresenta algum detalhe ou informação do texto que estão interpretando: Todas as evidências que usam estão fora das escrituras, na voz de pessoas que não reconhecem a Jeová como Deus. Isso implica em dizer que o texto já não é importante. Mas, isso não é verdade: A Palavra de Deus sempre é mais importante que qualquer outra publicação, e temos demonstrado que o texto diz com clareza que Jesus não é criado, não é o Deus com quem estava, mas era tão Deus quanto Ele, saindo apenas do texto das escrituras.
Para terminar o raciocínio, A Sentinela afirma que o Sr. Lingard caiu na própria armadilha, ao traduzir um texto segundo as suas próprias ideias. Será isso verdadeiro?
Sobre isso, devemos fazer uma pergunta: Esse artigo demonstra qual é o modo correto de se entender o texto? Não, ele simplesmente defende que a inserção do artigo indefinido no texto é o modo correto de se entender o texto, e ataca a opinião do Sr. Lingard. Em outras palavras, a Sentinela demonstrou por fato que sua INTERPRETAÇÃO foi motivada por teologia e não pelo próprio texto que se propõe a interpretar.
Com isso, estamos dizendo que o Sr. Lingard estava certo quando disse: “não são as Escrituras que os informam, mas são eles que acrescentam suas próprias ideias à linguagem das Escrituras“.