17 de janeiro de 2012

LEI DE DEUS & LEI DE MOISÉS

A Bíblia descreve várias leis com destaque para a Lei de Deus que abrange os Dez Mandamentos e, escrita em tábuas de pedra (1). Outras foram agrupadas num livro e disciplinam diversos assuntos. E é justamente nesta questão básica que ocorre uma preocupante distorção quanto ao termo "lei" usado nas Escrituras, acarretando inúmeras contradições e graves erros doutrinários.

Na Lei de Deus, chamada também "Lei da Liberdade" (Tiago 1:25) e "Lei Régia" (Tiago 2:8) não existe orientações sobre alimentação, higiene, procedimentos litúrgicos, processos penais e etc. Nela encontramos unicamente preceitos morais e éticos sintetizados nos Dez Mandamentos. A Bíblia relata que Deus a escrevera pessoalmente não adicionando nada a mais ao concluí-la (2):
"Deu-me o SENHOR as duas tábuas de pedra, escritas com o dedo de Deus; e, nelas, estavam todas as palavras segundo o SENHOR havia falado convosco no monte, do meio do fogo, estando reunido todo o povo." (Deuteronómio 9:10)
Posteriormente, Moisés sob orientação do SENHOR, escreveu um livro que era conhecido como: Livro de Moisés, Livro da Aliança, Livro da Lei e Lei de Moisés (4). Nele havia diversas regulamentações civis, levíticas, sanitárias, tributárias, militares e etc (3). E, embora Moisés tenha sido o responsável por esta obra, os israelitas tinham plena convicção que todas as instruções ali presentes eram provenientes de Deus e por isso chamavam este livro, também, de Livro da Lei do SENHOR ou Livro da Lei de Deus.(5) A abrangência dele quanto as diversas regras religiosas, administrativas e jurídicas tinha como objetivo proporcionar meios para a governabilidade da nação israelense.

Várias normas cerimoniais praticadas na liturgia mosaica visavam simbolizar a Cristo e guiar o pecador até Ele, e estas foram cravadas na cruz do Calvário.(6) Contudo, princípios e regras morais do Livro de Moisés derivados diretamente dos mandamentos das "Tábuas de Pedra" (Lei de Deus) permanecem, como por exemplo: Êxodo 23:1-9; Levítico capítulo 18; Levítico 19:13-18. Permanecem as leis sobre saúde, tais como as de Levítico capítulo 11; leis civis e judiciais (7) (observando os procedimentos legislativos e jurídicos - atuais e locais); e etc.
Destacamos: Apesar de Moisés ter transcrito a Lei de Deus (Dez Mandamentos) para o livro em questão, isto não significa que esta lei passou a ser considerada de menos importância e validade com relação às demais. Ele somente escreve para o livro uma cópia do conteúdo das duas tábuas de pedra que estavam guardadas dentro da arca da aliança. O acesso a estas era extremamente restrito devido a santidade da mesma e do lugar onde estavam colocadas. E, para que a nação pudesse ter à sua disposição uma leitura fiel das mesmas, Deus ordenara que Moisés a transcrevesse para o livro.

A enorme confusão que assola o cristianismo e mais especificamente o protestantismo com relação aos Dez Mandamentos provém do desprezo ao ensino bíblico que revela os diferentes tipos de leis. O
uso da palavra "lei" na Bíblia é diversificado e complexo, não se obtém o verdadeiro entendimento, em cada caso, com versos isolados dos seus contextos. A falta de discernimento a este respeito tem acarretado deturpadas interpretações bíblicas e de maneira mais acentuada nos escritos do apóstolo Paulo.

As Escrituras relatam que alguns judeus que se convertiam ao cristianismo defendiam que as cerimónias eram sem valor para a Nova Aliança e regidas pela Lei de Moisés, fossem seguidas. Essa situação levou Paulo a rebatê-las, o que proporcionou diversos conflitos como os registados em II Coríntios 3:1-18; Gálatas 2:1-21; Colossenses 2:8-23. Motivado por esses fatos, ele foi impulsionado a dizer aos gálatas:
"Sabendo, contudo, que o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em Cristo Jesus" (Gálatas 2:16 cf. Gálatas 3:11; Gálatas 4:8-11).
Ele repreendia o ensino de que o cerimonialismo mosaico deveria ser seguido, e, censurou-os dizendo: "Não anulo a graça de Deus; pois, se a justiça é mediante a lei, segue-se que morreu Cristo em vão" (Gálatas 2:21).

Paulo demonstrava que seguir as prescrições cerimoniais orientadas pela Lei de Moisés e pertinentes a Antiga Aliança, sobretudo aquelas que representavam o sacrifício de Cristo na cruz, era desprezar o Seu sangue ofertado para pagar os nossos pecados; era anular a Sua graça. E, diferentemente do ocorrido nas igrejas de Corinto, Galácia e Colossos, Paulo não teve esse problema nas igrejas de Roma. Aos romanos ele exortava referindo-se não as ordenanças contidas na Lei de Moisés, mas, aos mandamentos da Lei de Deus:
"Porque os simples ouvidores da lei não são justos diante de Deus, mas os que praticam a lei hão-de ser justificados. Anulamos, pois, a lei pela fé? Não, de maneira nenhuma! Antes, confirmamos a lei." (Romanos 2:13; Romanos 3:31)
Note a exorbitante diferença entre Romanos 2:13 e Gálatas 2:16.

E o apóstolo Pedro, responsável pelo ensino do Evangelho aos judeus, após ser alertado por Paulo a não permitir que esses ensinos fossem mantidos, escreveu a seguinte exortação:
"... empenhai-vos por serdes achados por Ele em paz, sem mácula e irrepreensíveis... como igualmente o nosso amado irmão Paulo vos escreveu... ao falar acerca destes assuntos, como, de fato costuma fazer em todas as suas epístolas, nas quais há certas coisas difíceis de entender, que os ignorantes e instáveis deturpam, como também deturpam as demais Escrituras, para a própria destruição deles..." (II Pedro 3:14-18).
Outra referência que, além de evidenciar a distinção de leis nas Escrituras, revela a validade dos mandamentos da Lei de Deus e a caducidade de várias ordenanças da Lei de Moisés:
"Foi alguém chamado sendo já circunciso? Não desfaça a sua circuncisão. Foi alguém chamado sendo incircunciso? Não se circuncide. A circuncisão não significa nada, e a incircuncisão também nada é; o que importa é obedecer aos mandamentos de Deus." (I Coríntios 7:18-19 - Tradução: Nova Versão Internacional)
PECULIARIDADES DAS LEIS
A Lei de Deus, onde se encontram os dez mandamentos (Decálogo), foi escrita pelo próprio Deus e guardada dentro da arca da aliança. Sobre esta lei, Cristo declara ser eterna. (8) Quando a Bíblia se refere as ordenanças do Livro da Lei nota-se um tratamento diferenciado, sobre ele é dito que fora escrita por Moisés, depositado ao lado da arca da aliança e vários de seus preceitos findaram na cruz, pois eram "sombras dos bens vindouros".(9)

Considerar que a Bíblia contém uma única lei, ou, que a palavra lei encontrada nela se refere unicamente a Lei de Moisés, é o mesmo que dizer ser a Bíblia um amontoado de contradições e afirmar que Paulo fazia acepção de pessoas quando comparamos Romanos 2:13 com Gálatas 2:16. É obrigatoriamente assumir que os Dez Mandamentos foram abolidos na cruz do Calvário, e assim apoiar um dos maiores ataques criados por Satanás contra eles (Apocalipse 12:17).

Dois versos bíblicos são interpretados de maneira indevida para apoiar a ilusão de que o Decálogo foi revogado:
"Aboliu, na Sua carne, a lei dos mandamentos na forma de ordenanças, para que dos dois criasse, em si mesmo, um novo homem, fazendo a paz." (Efésios 2:15) "Tendo cancelado o escrito de dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removeu-o inteiramente, encravando-o na cruz". (Colossenses 2:14)
O termo grego para "escrito de dívida" é "cheirographon" (χειρογραφον) e refere-se a "manuscrito" ou "nota manuscrita"(a). Cheirographon deriva de "cheiropoietos" (χειροποιητος) e significa feito pelas mãos humana. A palavra "ordenança" utilizada provém de "dogma" (δογμα) e denota doutrina, decreto, regras e requerimentos da Lei de Moisés(b).
Essas informações esclarecem de forma inquestionável que esse "escrito de dívida" refere-se as ordenanças que Moisés escreveu em um livro, e não ao que Deus determinou nas tábuas de pedra. Paulo se refere a dívida que foi gerada pelo povo israelita em decorrência do desprezo deles para com a Antiga Aliança e que era norteada pelas ordenanças do Livro da Lei (Lei de Moisés). Isso ocasionou enorme separação entre o povo de Israel e Deus (Isaías 1:1-16; Oseias 2:10-13; Efésios 2:14-16).

Na epístola aos romanos afirma-se que a Lei de Deus é santa, justa e boa (Romanos 7:12); que é agradável quando obedecida e que deve ser observada (Romanos 7:12-25; Romanos 3:31). Que o homem guiado por sua natureza pecaminosa não se submete às suas orientações e causa inimizade contra a Deus:
"Quem vive segundo a carne tem a mente voltada para o que a carne deseja; mas quem vive de acordo com o Espírito, tem a mente voltada para o que o Espírito deseja. A mentalidade da carne é morte, mas a mentalidade do Espírito é vida e paz; a mentalidade da carne é inimiga de Deus porque não se submete à Lei de Deus, nem pode fazê-lo. Quem é dominado pela carne não pode agradar a Deus." (Romanos 8:5-8 - Tradução: Nova Versão Internacional)
É nítido o contraste quanto as legislações abordadas.

Ainda sobre as peculiaridades dessas leis: A Lei de Deus revela o pecado (10), enquanto a Lei de Moisés prescrevia ofertas por causa do pecado (11); e estas ofertas eram apenas simbolismos de Cristo, o único que pode perdoá-lo (12). A Lei de Deus não possui regras punitivas para os seus transgressores, tais normas penais eram encontradas na Lei de Moisés e foram seguidas, também, de forma transitória até a época de reforma. (13)

Antes do sacrifício de Cristo na cruz, aquele que aceitasse o pacto da Antiga Aliança e, posteriormente, violasse as ordenanças contidas na Lei de Moisés e/ou transgredisse os mandamentos da Lei de Deus era punido de forma imediata, em alguns casos com a morte dependendo do crime.

E, embora os procedimentos punitivos do Antigo Concerto estejam invalidados atualmente com o Novo Concerto e, o pecador não receba punição como nos tempos do ministério mosaico(c), isso não significa que a Lei de Deus (reafirmada na Nova Aliança - Hebreus 8:10-13 cf. Hebreus 10:16-17) perdera valor, e que as transgressões cometidas contra ela não sofrerão as devidas punições; pois, pecado continua sendo a transgressão aos seus princípios. (14) Quando Cristo voltar pela segunda vez, Ele retribuirá a cada um conforme as suas obras. Nada ficará impune. (15)

O apóstolo João declara que os Dez Mandamentos não são penosos e um coração confiante e tranquilo reflete a obediência a eles, pois Cristo capacita todo aquele que O ama a obedecê-los. (16)

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a, b. STRONG, J. (1981). The Exhaustive Concordance of the Bible, ed. Macdonald Publishing Company, referências n.º 5498, 5499, 1378.
c. Sobre o Antigo e o Novo Concerto acesse: Os Ministérios da Lei de Deus
1. Êxodo 32:15; Êxodo 34:28; Deuteronómio 4:13; Deuteronómio 9:9-11.
2. Êxodo 20:1-20 cf. Deuteronómio 5:1-22; Êxodo 31:18; Êxodo 34:1-2.
3. Êxodo capítulos 23, 29 e 30; Levítico capítulos 1-7, 21 e 22; etc.
4. Êxodo 24:7; Deuteronómio 29:21; Deuteronómio 31:24-26; Josué 1:8; II Reis 23:2 e 21; II Crónicas 25:4; II Crónicas 34:30; Neemias 8:1; Neemias 13:1; Marcos 12:26; Lucas 2:22; Lucas 24:44; Atos 15:5; I Coríntios 9:9; e etc.
5. Josué 24:26; II Crónicas 17:9; II Crónicas 34:14; Neemias 8:18; Neemias 9:3.
6. João 1:45; João 5:46; Marcos 15:37-39; Gálatas 3:23-29.
7. Deuteronómio 17:8-9; Deuteronómio 21:18-20 cf. Romanos 13:1-4; Tito 3:1-2.
8. I Reis 8:8-9; Mateus 5:17-19; Lucas 16:17 cf. Malaquias 3:6; Tiago 2:10-12.
9. Deuteronómio 31:9, 24-26; Efésios 2:14-16; Colossenses 2:12-17; Hebreus 9:9-10 cf Hebreus 10:1.
10. Romanos 3:20; Romanos 7:7; Tiago 2:8-9; I João 3:4.
11. Levíticos capítulos 4-7, 16 e etc.
12. Hebreus 9:23-28; Hebreus 8:1-13; Hebreus 9:9-10 cf. Apocalipse 13:8.
13. Colossenses 2:13-15; Hebreus 7:18-19 cf. Efésios 2:14-16.
14. Romanos 4:15; Romanos 7:1; Tiago 2:8-13; I João 3:4.
15. Mateus 24:29-31; II Tessalonicenses 2:7-10; Apocalipse 22:11-15; Hebreus 4:12-13.
16. I João 5:1-5; I João 3:21-24; João 14:12-26 cf. II João 1:4-6; Hebreus 10:16-17.